Yara, uma guerreira

Yara, uma guerreira

Ponto Um

Existem coisas que só faço fora de Limeira. Fazer as unhas das mãos e dos pés é uma delas e, aproveitando uma caminhada para a digestão do café-da-manhã, fui até o Shopping Alpha, em Ilha Grande. Não é um shopping de verdade; é apenas uma pequena galeria com lojinhas de informática, uma barbearia – na qual cortei o cabelo – e no fundo, um simpático espaço dirigido por uma mulher muito interessante. Enquanto minha mulher “caçava” alguém para fazer seu cabelo, perguntei se poderia ser “encaixado” e assim aconteceu. “Posso aproveitar e fazer os pés?”, perguntei. Yara, depois de respirar profundamente, disse que não conseguiria porque teria apenas meia hora para almoçar: “estou tentando desinchar um pouco, se é que me entende, e só consigo se fizer as refeições nos horários certos”. Yara não me parecia gorda, era apenas fortinha, e logo entendi por que ela precisava de uma vida regrada. Enquanto avançava em minha mão esquerda, passou um vendedor de empadas: “Não sr. Luiz, hoje não dá, eu quero, mas não posso”. Segundo ela, aquela era a melhor empadinha de Ilha Grande, quando acrescentou: “Daqui a pouco, passa o cara da coxinha, essa sim é de comer rezando”. A melhor conversa com Yara aconteceu no dia seguinte, fazendo meus pés. Embora tivesse demonstrado desânimo com o Brasil, ele sugeriu uma saída: “Enquanto o povo não tiver educação, nada vai dar certo aqui; consegui viajar por mais de uma dúzia de países, morei mais de dois meses no Japão, e posso dizer: são nações organizadas; as pessoas se respeitam nas ruas”. Negra, também falou sobre racismo: “Esses movimentos não me representam, as pessoas devem parar de se fazer de vítimas e construir alguma coisa”. Sobre relacionamentos, disse que os homens de hoje são folgados: “Alguns me pedem pix, tô fora!”. Finalmente, falou de política: “Deixei de votar há dez anos, mas agora vou acertar meu título; quero fazer tudo que posso para tirar aquele “nove dedos” de lá. E olha, me divirto perguntando aos petistas se estão contentes, eles nem respondem. A hora que o Tarcísio for, estou dentro”. Yara tem cerca de 50 anos, paga 2.400 de aluguel e mora com seu gato em uma ilha. Trabalha seis dias por semana para sobreviver; é ex-dançarina e, durante a pandemia, aproveitou para estudar, fazer cursos, e hoje, além de manicure, faz massagens, sobrancelhas, reflexologia e não se lembrava da última vez que pisou na areia. Yara vai à luta: todos nós vamos à luta; mas está ficando cansativo, cada vez mais. 

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