Tempero de Mãe

Tempero de Mãe

Ponto Um 

Vejam só. Não é que realizei uma proeza no meio semana? Acertei no molho, na cor e no sabor, quatro sobrecoxas de frango feitas na panela. Como descrevi para minha irmã Fabiana, minutos depois, com foto e tudo, “cozinhei um frango 90% parecido com aquele que a mamãe fazia!”. De vez em quando ela faz isso também, e talvez não haja nada mais saboroso e reconfortante que trazer à memória os pratos feitos por nossas mães. Até minha mulher se impressionou: “me fez lembrar de minha mãe, bem”. Mas é uma longa história. Tive o privilégio, há muitos anos, de dividir com a mamãe um curso rápido de culinária no Grande Hotel São Pedro, durante o qual pensava: “o que ela tem mais para aprender?”. Na verdade, ela ensinou, ao seu modo, alguns segredos aos professores daquele curso, pois como dizia, “Betinho, não se esqueça que ganhei um concurso no SESI!”. De fato, ela ganhou mesmo, e recebeu até um liquidificador novinho em folha, o qual manteve em sua bancada por muito tempo. Meu gosto pela culinária, obviamente, nasceu daí, das tardes de domingo fazendo molhos, ensopados e assados. Me divertia com suas explicações quando havia algum imprevisto, suas frases e gestos que os imito até hoje, e depois que essa curva se inverteu, ou seja, eu passei a cozinhar para ajudá-la, fazia de tudo para aproximar as receitas daquilo que ela gostaria de receber. Sempre aguardava a sua avaliação, mas era meio bobinho, na época. Jamais conseguiria chegar perto de seus pratos porque as mães – e só descobri isso quando passei noções da cozinha para o meu filho, que as utiliza hoje, diariamente, a 30 mil quilômetros daqui – colocam ingredientes emocionais na comida que são únicos. O amor de alimentar uma família, o principal deles, não se compara a qualquer tempero, azeite, sal ou pimenta. Receitas de mãe são únicas e foram feitas para os momentos que vivemos com elas, e podem reparar. Nas paredes das cozinhas do nosso passado não havia diplomas. Nem certificados. Me lembro disso porque no último artigo publicado pela antropóloga Mirian Goldenberg, “A arrogância dos gênios ridículos”, ela aborda o quanto algumas pessoas vivem para diminuir as outras. Gente que não dá valor a nada, a não ser seus próprios conceitos, feitos ou graduações. Por isso prefiro escolher médicos que decorem seus consultórios com pinturas à óleo ou gravuras. Aos soberbos, que o tempo se encarregue de provar o quanto são insignificantes no convívio social. Porque seus corações não carregam tempero de mãe. 

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