Ponto para o Jornalismo

Ponto para o Jornalismo

EDITORIAL

Há uma crendice no jornalismo esportivo: “pega mal” um comentarista revelar o seu clube de coração. O conhecido Flávio Prado, da Jovem Pan, sempre escondeu o fato de ser um ferrenho torcedor do São Paulo, e só recentemente, algo como duas semanas atrás, explicou o assunto. Disse, durante um bate-papo com seus companheiros de estúdio, que seu pai sempre contribuiu com as demandas do Tricolor, o que naturalmente o tornou torcedor da agremiação, mas que fechou seu coração ao “mais amado” com a entrada de Juvenal Juvêncio, em sua primeira gestão. Flávio Prado e seu pai desaprovaram a condução do departamento de futebol, mas a questão é: revelar a torcida diminui a capacidade profissional de um jornalista? Vamos ao campo puramente noticioso, agora. Ainda está no imaginário de muita gente a gravação feita na redação da TV Globo quando se deu o anúncio da eleição do presidente Lula em 2022. Durante aquele clima pré-eleitoral ideologicamente belicoso, é possível que muitos tenham cancelado suas assinaturas da emissora e outros tantos passaram simplesmente ignorá-la, mas é preciso distinguir predileção ou torcida por distorção da verdade. O que não cabe no jornalismo profissional. Um veículo pode aumentar ou diminuir a exposição de fatos, é um critério pertinente. A rede Globo faz isso constantemente contra o ex-presidente Jair Bolsonaro, a exemplo dos casos da carteira de vacinação e das joias, retaliando aquilo que sofreu economicamente. Mas a escolha de onde e como receber informações é livre; se não gosta, mude. A Folha de S. Paulo também é claramente progressista. Aliás, em regra, jornalistas também, e qual o problema? Nenhum. Porém, a divulgação das manobras feitas pelo ministro Alexandre de Moares contra apoiadores de Bolsonaro, fez o jornal ganhar pontos a mais com seus leitores. E não apenas ou exatamente com os bolsonaristas, com todos os motivos para comemorar as denúncias como fez a redação da Globo. Fez a Folha ganhar pontos com leitores habituais, comuns, que sabem separar as tendências dos excessos, e que dependem de notícias e análises para formarem suas convicções. Apenas para contextualizar, reportagem assinada pelos jornalistas Fábio Serapião e Glenn Greenwald revela que “conversas entre o gabinete de Alexandre de Moraes no STF (Supremo Tribunal Federal) e o órgão de combate à desinformação do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), à época sob seu comando, indicam que em vários casos os alvos de investigação eram escolhidos pelo ministro ou por seu juiz assessor”. O ministro nega, argumenta que tem “poder política”, mas o que tempos por enquanto é uma “vaza jato” suprema. A verdade deve prevalecer, sempre; torcer não é proibido, mas mentira não combina com jornalismo.

Roberto Lucato

Ilustração: Freepik

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