O Brasil ficando sem cartas
EDITORIAL
Dizem que os baixinhos são bons de briga, mas isso é bobagem. É preconceito contra a altura e subestimação da inteligência, desde que o mundo é mundo, aliás. Porém, há um pouco de verdade nisso: os “fortões” são mais acostumados ao respeito devido ao tamanho, enquanto os mais fracos preferem negociar, e o Brasil passa por um momento delicado do ponto de vista econômico e institucional. Donald Trump colocou vários motivos o mesmo pacote e mantém, de maneira inflexível, as sanções comerciais impostas o país, e o andar da carruagem não é bom, ao menos agora. Ao não vincular diretamente, mas passar pelo assunto em sua manifestação dirigida ao presidente Lula, o norte-americano deu uma estocada no STF em forma de chumbada junto com o anzol. Insatisfeito com o tratamento dado pela Justiça a Jair Bolsonaro segundo sua manifestação, Trump, como sempre faz, foi enigmático em sua provação e muitos se perguntam, até agora, se suas insinuações atentaram contra a soberania brasileira ou se, como pano central de sua irritação, estava a liderança do Brasil junto aos BRICS, integrada por dois países definitivamente não alinhados com os norte-americanos. Colocando os “pingos nos ís”: ninguém joga sem cartas. Elas podem até não ter qualquer valor, como no truco ao qual Lula se referiu, mas cartas são fundamentais. Grosseiramente, o Brasil, por não conseguir abrir canais de negociação, parece apostar exclusivamente no recuo de Trump, algo que já aconteceu em outras ocasiões. Afinal, o tarifaço aumentará o valor do café da manhã dos norte-americanos, possivelmente dos automóveis e aeronaves, mas ele aposta que seus eleitores compreenderão porque se trata de uma negociação. Dura, mas uma negociação. Por esse aspecto, temos cartas mais baixas, no caso; há, somente, uma espécie de esperneio diplomático. E o presidente Lula, que até a semana passada se aproveitou – e bem – dessa confusão, chamando de meu bem o nacionalismo, terá que enfrentar uma realidade um tanto pior se não houver recuo dos Estados Unidos. Lula era habilidoso para negociar com a Autolatina, mas agora o sarrafo é mais alto e se, de fato, os BRICS forem o pomo da discórdia e não Jair Bolsonaro, estaremos longe de um acordo por questões ideológicas, e não propriamente de governo. Os últimos grãos de areia, enquanto isso, escorrem pela ampulheta.
Roberto Lucato
Ilustração: Freepik