Na prática, o amor e a fé

Na prática, o amor e a fé

EDITORIAL

A chamada “liturgia do cargo” impõe a qualquer liderança formalmente constituída um conjunto comportamental, nem sempre reconhecido ou seguido. Por consequência, isso causa aquilo que conhecemos como “embaraços”, mas somente isso. E desde suas primeiras manifestações, ainda indagado por jornalistas, o Papa Francisco confirmou tudo aquilo que levou para o Vaticano: sua visão missionária, igualitária e fraterna. E devermos considerar que ninguém se torna líder da uma igreja sem que tenha passado anos a fio observando, de maneira crítica, inúmeras carências, desde mensagens ultrapassadas até o desinteresse de corrigir erros, ou, minimamente, adaptar-se a uma dinâmica mais rápida dos chamados “usos e costumes” da sociedade. E não são poucos os problemas. Para levar, traduzir e seguir o Evangelho para uma comunidade estimada em 1,3 bilhão de fiéis, um papado deve manter uma linguagem não apenas universal, mas suficientemente compreensível e crível. Francisco, para um segmento cada vez mais preocupado com a modernização da igreja católica, cumpriu o que dele se esperava. Porque, se para conquistar mudanças estruturais se exige um trabalho complexo, Francisco optou, com inteligência e simplicidade, por expor essas questões com naturalidade. Quando se referiu ao acolhimento à comunidade gay, há mais de uma década, o Santo Padre falou como se estivesse batendo um papo em uma mesa de bar, tal foi a sua franqueza ao tratar do assunto. Mas isso foi apenas uma indicação daquilo que mais lhe interessava: o acolhimento, Para uma igreja que se mostrava cada vez mais isolada em suas visões seculares, Francisco se manifestava sobre os conflitos internacionais, sobre os reflexos econômicos na dinâmica social, valorizou o serviço religioso feito mulheres e, surpreendentemente, começou a tratar de um assunto caríssimo aos conservadores: a recepção dos divorciados. Portanto, em pouco mais de dez anos, Francisco certamente será lembrado por seus interesses reformistas, o que não deve ser confundido, como querem muitos, com movimentos progressistas políticos. Agir em favor de comunidades excluídas do ponto de vista social é colocar em prática o próprio Evangelho, que em nenhum momento propôs a estruturação de uma igreja a favor de si mesma. Tomara todas essas virtudes sejam levadas em conta para a escolha do novo detentor do Anel de Pescador, para que se inspirem nesse papa corajoso, humano, gentil, espirituoso e extremamente fraterno.

Roberto Lucato

Ilustração: Crédito – © Tânia Rêgo/Agência Brasil

Compartilhar esta postagem