Favas não contadas
EDITORIAL
Dizem que o segredo das melhores cervejas não está na origem dos ingredientes, mas na qualidade da água. Porém, nada adianta sem o comando eficiente do chamado “mestre cervejeiro”. É ele que, por intuição e experimentação, determina se o equilíbrio entre malte, lúpulo e leveduras está bom. Existem rótulos de cerveja que já ultrapassaram a marca de cem anos e não há dúvidas que, durante todo esse tempo, algumas gerações foram formadas de modo a preservar “o que dá certo”. A independência dos Estados Unidos foi proclamada há mais de duzentos e cinquenta anos. Os chamados “pais fundadores” fizeram um trabalho extraordinário em 1787, especialmente quando redigiram a constituição. Simples, ela possui apenas sete artigos originais com vinte e uma seções, e recebeu até hoje apenas vinte e sete emendas. A última, em 1971, para garantir o direito a voto a partir dos dezoito anos. Comparada a brasileira, a Carta Magna estadunidense é menos complexa e diferente em muitos pontos. Um deles, deixou para os estados a decisão sobre vários pontos, talvez o mais conhecido, a pena de morte. Porém, em matéria de representatividade, não há parâmetros com o nosso complexo sistema eleitoral. Primeiro, porque eles aproveitam as eleições para deliberarem sobre assuntos locais que demandem votação. Depois, e isso é fascinante, não existe um tribunal para aprovar candidaturas, contas, tampouco para cassá-las, sequer para contar os votos. Cada estado faz a sua parte e apresenta o resultado; acreditem, há 178 anos, a Associated Press “é uma das fontes mais confiáveis para contabilizar os votos das eleições nos Estados Unidos” segundo reportagem recente. Já imaginaram isso por aqui, por exemplo, se os grupos Globo e Jovem Pan recebessem essa incumbência? Outra diferença: não há feriado no dia de votação e, todos sabem, lá o voto não é obrigatório. Como vimos, muitos estados também admitem o voto antecipado, incluindo o envio pelos correios e uma pergunta encerra essa exposição: isso daria certo no Brasil? Hoje, nos Estados Unidos, será um dia normal de trabalho, e em pouco tempo saberemos se os republicanos voltarão ao salão oval ou se os democratas permanecerão. Já analisamos muito os concorrentes à Casa Branca. Kamala Harris, sem dúvida, possui uma carreira impressionante; aparenta mais simpatia e senso de humanidade, mas Donald Trump é seguramente mais preparado para conduzir a economia, assunto que mais preocupa os eleitores. Se vencer, será por uma pequena diferença, o que parece ter mais probabilidade. Ah, esse sistema daria certo aqui? Como as velhas fábricas de cerveja, os norte-americanos não são favoráveis a alterar o que dá certo, no caso, uma fórmula. O Brasil não tem educação política para tanto.
Roberto Lucato
Ilustração: Freepik