Eleições artificiais

Eleições artificiais

EDITORIAL

No início desta semana, alguns portais noticiosos revelaram a iminente preocupação dos tribunais eleitorais sobre o uso da inteligência artificial nas próximas eleições, uma vez que tomaram ciência, em generosa amostragem, do que aconteceu recentemente em pleitos realizados no México, Paquistão, Índia e África do Sul. Entre as postagens mais ousadas com o uso desta tecnologia destacaram-se apoio inexistente a Donald Trump e um candidato; um discurso de um político morto há muitos anos e, algo muito criativo – para o mau –, a renúncia de dois candidatos – com som e imagem – às vésperas da votação, que jamais existiram. É um problema e tanto, não há dúvida, pois essa tecnologia consegue fazer o que os filmes de ficção científica produziram no passado, ou seja, criar uma realidade paralela que não existe. Quem acha que isso não é perigoso basta se imaginar sendo vítima de um comentário mentiroso: o problema que essa pessoa terá para desmentir a falsificação será gigantesco. Na política existem vários componentes a mais porque os candidatos se expõem diante da opinião pública, estando sujeitos a manifestações de seus adversários e, em alguns casos, inimigos. Vale lembrar que, sim, os postulantes às câmaras municipais compõem um número expressivo, razão pela qual enfrentam problemas adicionais: 1- falta de suporte jurídico para enfrentar a situação; 2- ausência de apoio institucional dos diretórios municipais como linhas auxiliares; 3- conhecimentos superficiais em marketing político, o que fragiliza decisões para combater – ou desmentir – eventuais notícias falsas que os envolvam; 4- Finalmente, obtenção de um tempo extra, em suas agendas, para dispensá-lo no monitoramento daquilo que eventualmente venham a sofrer. Tudo somado e subtraído, a verdade é que controlar o uso da tecnologia ainda está longe de um consenso, tanto é que no Brasil, até com o apoio de ministros do STF, alguns projetos já bateram na trave no parlamento. Teme-se que, com aplicação de restrições legais, a liberdade de manifestação seja maculada, impondo-se neste sentido uma espécie de censura. O que deve acontecer é muito simples: por falta exatamente deste consenso, os danos eleitorais com a utilização maléfica da AI serão sucessivos e apenas caberá aos órgãos julgadores avaliarem-nos depois da votação. O que significa que muitas candidaturas poderão não ser aquilo que um dia foram: vitoriosas.

Roberto Lucato

Ilustração: Freepik

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