Divulgação sim, ética também
EDITORIAL
Provavelmente quando as primeiras bicicletas com rodas de mesmo diâmetro ganharam as ruas as pessoas se impressionaram. Também possivelmente, decorridos duzentos anos desta experiência, o primeiro motorista de um carro elétrico demorou para acreditar que um veículo pudesse ser tão “macio e silencioso”. Em linha com as grandes revoluções, a internet proporcionou em poucas décadas muitas mudanças, para o bem e para o mal, como em regra acontece quando a mente humana procura outros fins, e não os originais. Um debate levado ao ar na noite de ontem trouxe mais uma questão que dificilmente será disciplinada: a chamada “etiqueta”, ou a ética, nos relacionamentos das mídias sociais. O assunto é um tanto macabro. Voluntários que estavam envolvidos com salvamentos na região sul do país, castigada pelas águas, revelaram uma enorme preocupação com o cenário que será encontrado quando as águas baixarem definitivamente. Diziam eles: “provavelmente ainda serão encontradas muitas vítimas desta tragédia, portanto fazemos um apelo: não fotografem ou filmem estas situações de horror e tristeza em respeito às vítimas e seus familiares; imploramos!”. Continuaram explicando. Nos últimos dias, além do aumento da circulação de notícias falsas em torno das enchentes e das condições de socorro e salvamento, muitos estão tornando públicas situações, por exemplo, de pessoas mortas expostas nas ruas, incluindo crianças. É o fim do mundo! Tecnicamente, a imprensa tradicional sempre encontrou parâmetros para divulgar os piores desastres da humanidade, incluindo guerras. O problema é que o dono de um celular se transformou em um potencialmente “jornalista”, sem a menor noção desses limites. Sem noção que “domínio público” não significa uma porteira aberta para a devassidão ou para a exposição da intimidade. Portanto, paralelamente à nebulosidade das notícias falsas, a sociedade terá que impor esses parâmetros, em uma nova e árdua discussão sobre a liberdade de expressão. O que? É isso aí.
Roberto Lucato