Dino, um boçal
EDITORIAL
Há um comentarista na grade de jornalismo da Globo News que se destaca, entre alguns poucos, pela predominância de análises relativamente neutras. Oriundo de institutos de pesquisa, Mauro Paulino se utiliza de estatísticas, sempre quando disponíveis, para embasar sua opinião. Durante a semana, ao comentar questões relativas à insegurança no Brasil, ele contou uma historinha. Disse que, na semana passada, sua filha mandou uma mensagem após a programação noturna, para não o assustar, que havia sido assaltada. Dois bandidos armados haviam roubado o seu celular. Paulino disse que sua filha é uma jovem universitária, que também trabalha, e isso teria acontecido pela terceira vez na cidade que residem, em São Paulo. De fato, é muito difícil que alguém não tenha sido assaltado nos últimos anos, ou que não conheça uma pessoa em seu entorno sem uma ocorrência. Por isso considerei uma agressão aos ouvidos e ao sentimento de milhões de brasileiros o discurso de transmissão de cargo feito ontem por Flávio Dino. Sem ruborizar-se, o futuro ministro do STF orgulhou-se em apresentar os números da violência pública no Brasil, segundo ele, todos em vertiginosa queda: roubos a carros, bancos e residências, além de homicídios e assaltos de um modo geral. O futuro ministro, que terá que analisar situações de Fake News, poderia desde já julgar a sua própria fala, a começar pelo fato de o governo federal não ter responsabilidade direta por ações de segurança em cidades e estados. Dino, que há mais um ano capitalizou politicamente os episódios de 8 de Janeiro, não conseguiu sequer propor uma política nacional de segurança pública, o que falta ao Brasil há décadas. Nem organizar a Polícia Federal de modo a despolitizá-la, enfrentando em sua saída do Ministério da Justiça uma crise sem precedentes na ABIN. Dino deveria ter ouvido o depoimento de Paulino, de residentes de São Luís e de qualquer brasileiro que hoje está amedrontado com esta situação.
Roberto Lucato
Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/Agência Brasil