O tempo é implacável, às vezes nem tanto

O tempo é implacável, às vezes nem tanto

EDITORIAL

Quando algum filme reproduz audições de piano feitas entre os séculos XVI e XVII dá uma certa inveja não ter nascido nesses tempos. Porque a música clássica, criada pelos maiores gênios que a humanidade já conheceu, mal sabia, mas seria eternizada. Há diversos estudos, inclusive, que relacionam benefícios terapêuticos para aqueles que ouvem, habitualmente, obras de Beethoven, Bach ou Johann Strauss. Quem se orgulha deste país poderia, certamente, incluir Heitor Villa-Lobos, reconhecido um século mais tarde, e talvez sua obra mais reconhecida, as Bachianas Brasileiras, mas isso não vem ao caso. O certo é que, da renascença até agora, músicos, portas, escritores, escultores e pintores deixaram um legado de imensa profundidade. Para tornar o assunto muito horizontal, nesta semana a mídia progressista paparicou o aniversário de Chico Buarque, outro a integrar um seleto grupo de octogenários que deixou marcas importantes na música brasileira, quando ainda ela era chamada de Popular Brasileira, ou MPB. Deste grupo mais ativo, entre eles, Caetano, Gil, Roberto Manescal (este mais ligado a Bossa Nova) e Roberto Carlos (neste caso, à Jovem Guarda), entre outros poucos, somente Milton Nascimento pendurou o microfone. E a pergunta é: por quanto tempo suas obras serão lembradas e como serão vistos no futuro, dentro de 100 anos? As comparações são sempre perigosas, mas provavelmente dentro de, no máximo, 30 anos, a geração que conheceu esses artistas na década de 1960 estará no céu. Os filhos dessa, herdarão somente discos de vinil riscados que terão pouca utilidade e os netos, nem isso. Canções que levaram ao êxtase os admiradores de Chico Buarque como Cálice, Meu Caro Amigo e Apesar de Você, escritas dentro de um contexto político, terão que ser contextualizadas pelo Google ou por Alexas da vida. De maior longevidade, talvez, restarão suas obras literárias, todas digitalizadas, mas nenhuma mencionada pelos sítios de busca como best-sellers. Chico foi um bom artista, sem dúvida, mas seu envolvimento político recente pode ter animado muita gente, mas desapontou um bocado de pessoa que jamais se animará em recordar A Banda ou Anos Dourados. Aliás, Chico, “Quem te Viu, Quem te Vê”.

Roberto Lucato

Ilustração: Divulgação Brazilian Beat

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